Uma dúvida bem comum entre os autores iniciantes é saber “Quais são as estratégias do narrador quanto ao processo de escrita de um texto literário narrativo?” Nesse texto, vamos abordar uma delas: a estratégia quanto ao Foco Narrativo.
Antes de mais nada, é preciso saber que para ser considerado um texto literário narrativo, ele precisa conter em sua estrutura alguns elementos que são considerados essenciais, que são: personagens, enredo, narrador, tempo e espaço:[1]
Quadro – Cinco elementos essenciais da narrativa
Personagens: pessoas que estão presentes na história ou representações fictícias de seres humanos, que podem ser descritas do ponto de vista físico, psicológico, social, moral etc. Enredo: história que narra uma sucessão dos acontecimentos. O enredo é o resultado da ação dos personagens, é a sucessão de fatos (aventuras, peripécias ou conflitos). Narrador ou foco narrativo: se refere àquele que conta a história (se participa ou não dos fatos), e a perspectiva pela qual ele conta (se tem uma visão total ou parcial dos acontecimentos). Tempo: o período em que acontece a história (o tempo cronológico é dado em horas, dias, meses ou anos e o tempo psicológico é interior ao personagem, como as suas memórias e reflexões). Espaço: local onde se passa a história (é o ambiente no qual os personagens se movimentam). |
Onde, quando, como e com quem ocorreu o episódio?
Dos cinco elementos essenciais citados, “a” personagem ou “o” personagem é um ser fictício que é responsável pelo desempenho do enredo; em outras palavras, é “quem” faz a ação.[2] No entanto, determinar “como” se dá a ação cabe ao narrador.[3]
No texto, o personagem é revelado pela ótica do narrador – ele (o narrador) é quem decide que informações serão dadas ou ocultadas do leitor; é pela sua voz que o mundo narrativo se dá a conhecer. Se sabemos o que pensa, faz ou sente o personagem, o narrador é quem nos revela. Seja uma história própria (narrada em 1ª pessoa) ou de outrem (3ª pessoa), o narrador é quem controla e revela a ação.[4]
A partir dessas observações iniciais, os autores iniciantes precisam definir as estratégias do narrador quanto ao processo de escrita.[5] Ou seja, além de ser aquele que conta a história, o narrador é o responsável pela perspectiva dos acontecimentos (o ponto de vista) e pelas vozes e tons dos personagens (o discurso).[6] Daí a importância de se conhecer melhor o Foco Narrativo e o Discurso narrativo[7]:
De fato, o narrador possui uma importante função nas narrativas[8] em que aparece: a de definir o foco narrativo da história, a partir do seu ponto de vista. Foco narrativo é definido como sendo um “problema técnico da ficção que supõe questionar “quem narra?”, “como?”, e “de que ângulo?[9]”. Para alguns é sinônimo de ponto de vista, perspectiva, situação narrativa ou mesmo de narrador.[10]
O foco narrativo é, em síntese, o ponto de vista do narrador acerca de uma história, e pode ser dividido em dois tipos, como vemos no quadro abaixo:
Quadro – Estratégias do narrador quanto ao foco narrativo
Foco Narrativo | ( ) primeira pessoa: o narrador é um dos personagens. Nesse caso, ele apresenta aquilo que presencia ao participar dos acontecimentos (é o chamado narrador-personagem). ( ) terceira pessoa: o narrador (é onisciente. Ele nos oferece uma visão distanciada da narrativa, além de dispor de inúmeras informações que o narrador me primeira pessoa não oferece (é o chamado narrador-observador). |
Então, veja que há narrativas em primeira pessoa e narrativas em terceira pessoa. Tal característica da narrativa é consequência das funções de seu narrador dentro da história. A narrativa em primeira pessoa é um tipo de narrativa literária em que a história é contada por um personagem, que utiliza os pronomes “eu” ou “nós“.
Com efeito, o narrador na terceira pessoa ou narrador observador é aquele que se encontra fora dos acontecimentos que está narrando, possuindo um ponto de vista imparcial. Suas principais características são a onisciência – o narrador sabe tudo o que acontece na estória – e a onipresença – o narrador está presente em todos os lugares da estória, a todo momento.[11]
Assim, quando escolhem uma dessas opções como estratégias do narrador para o foco narrativo, os escritores iniciantes estão definindo se “aquele que conta a história” participa ou não dos fatos, e qual é a perspectiva pela qual ele conta (se tem uma visão total ou parcial dos acontecimentos).
No próximo post vamos dar continuidade ao assunto falando sobre as estratégias do narrador quanto ao discurso narrativo.

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Notas
[1] Com efeito, a narrativa é estruturada sobre cinco elementos principais: personagens, enredo, narrador, tempo e espaço (GANCHO, 2006: 4).
[2] Conforme Cândida Gancho (2006: 13).
[3] Em síntese, narrar é contar um fato, um episódio; daí o termo narrativa em prosa. Logo, todas as vezes que uma história é contada (é narrada), o narrador acaba sempre contando pelo menos onde, quando, como e com quem ocorreu o episódio (Conf. Mundovestibular.com.br. Narração – Teorias e textos – ver bibliografia).
[4] Segundo BACCARO et. al. 2023: 42).
[5] De acordo com a tipologia de Norman Friedman (1955: 1169) citado por Vinício Berbat (2021: 36).
[6] Conforme Marina Silva (s/d web). O narrador, Brasil Escola (ver bibliografia).
[7] A saber, o Discurso Narrativo será objeto do próximo post.
[8] Em suma, Narrativa: é um termo geral para “prosa de ficção”. Pode englobar também a História (LEITE, 2007: 86).
[9] Conforme Ligia Leite (1989: 89), citada por Daniel Pinna (2006: 158).
[10] De acordo com Lígia Leite (2007: 93).
[11] De conformidade com Cardoso (2001: 36-37) citado por Daniel Pinna (2006: 158).
Bibliografia
BACCARO, Fernanda; FERNANDES, F. Orci; ROSÁRIO, K. N. Silva & ROCHA, Bráz. Língua Portuguesa – Ensino Médio – Volume 1, 1ª Série – Leonardo Da Vinci (Coleção Lumen): Poliedro – Sistema de Ensino, 2023.
BERBAT, Vinício Lima. Da tipologia à imagologia: personagem e ponto de vista em E.M. Foster. (Dissertação de mestrado em Letras) Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2021.
GANCHO, Cândida Vilares. Como analisar narrativas. 7ª ed. revista e atualizada. São Paulo: (Série Princípios; 207) Ática, 2006.
LEITE, Ligia Chiappini Moraes, 1945 – O foco narrativo (ou a polêmica em torno da ilusão). 10 ed. Série Princípios. São Paulo: Ática, 2007.
PINNA, Daniel M. S. Animadas personagens brasileiras: a linguagem visual das personagens do cinema de animação contemporâneo brasileiro (dissertação de mestrado). Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC, Departamento de Artes e Design, 2006.
SILVA, Marina Cabral da. “O Narrador“; Brasil Escola. (Redação, tipos textuais, narração) Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/redacao/narrador.htm. Acesso em 24/04/2023.
Outras referências bibliográficas
MUNDOVESTIBULAR.com.br. Narração – Teorias e Textos. In Mundo Vestibular (https://www.mundovestibular.com.br/estudos/portugues/narracao-teorias-e-textos). Acesso em 23/12/2013.
Por Francisco Hélio de Sousa
fhelios@gmail.com